sexta-feira, 11 de setembro de 2009


"But whatever you resolve to do, I want you to commit to it. I want you to really work at it.

I know that sometimes you get that sense from TV that you can be rich and successful without any hard work -- that your ticket to success is through rapping or basketball or being a reality TV star. Chances are you're not going to be any of those things.

The truth is, being successful is hard. You won't love every subject that you study. You won't click with every teacher that you have. Not every homework assignment will seem completely relevant to your life right at this minute. And you won't necessarily succeed at everything the first time you try.

That's okay. Some of the most successful people in the world are the ones who've had the most failures. J.K. Rowling's -- who wrote Harry Potter -- her first Harry Potter book was rejected 12 times before it was finally published. Michael Jordan was cut from his high school basketball team. He lost hundreds of games and missed thousands of shots during his career. But he once said, "I have failed over and over and over again in my life. And that's why I succeed."

These people succeeded because they understood that you can't let your failures define you -- you have to let your failures teach you. You have to let them show you what to do differently the next time. So if you get into trouble, that doesn't mean you're a troublemaker, it means you need to try harder to act right. If you get a bad grade, that doesn't mean you're stupid, it just means you need to spend more time studying.

No one's born being good at all things. You become good at things through hard work. You're not a varsity athlete the first time you play a new sport. You don't hit every note the first time you sing a song. You've got to practice. The same principle applies to your schoolwork. You might have to do a math problem a few times before you get it right. You might have to read something a few times before you understand it. You definitely have to do a few drafts of a paper before it's good enough to hand in.

Don't be afraid to ask questions. Don't be afraid to ask for help when you need it. I do that every day. Asking for help isn't a sign of weakness, it's a sign of strength because it shows you have the courage to admit when you don't know something, and that then allows you to learn something new. So find an adult that you trust -- a parent, a grandparent or teacher, a coach or a counselor -- and ask them to help you stay on track to meet your goals."

domingo, 2 de agosto de 2009

Para uma interpretação de A ONDA - II

A Onda define uma situação simbólica que pressupõe domínio, altivez face à maré; é a afirmação da sumptuosidade do mar. Transpondo-se para o ser humano pode tomar-se num sentido vitalista e de afirmação do super-homem nietzscheano. No caso concreto da fita, a afirmação individual aparece-nos a partir de uma roupagem de autocracia e, simultaneamente, imbuída de um poder carismático, personificados no professor e de um poder legal, em Karo. São, penso eu, as personagens mais vincadas e, por isso, o filme gravita à volta das suas características. Contudo, há uma diferença: a personagem do professor é fabricada e a personagem de Karon é autêntica e, acima de tudo, racional.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Para uma interpretação de A ONDA - I

A Onda – Uma leitura à volta do poder

Perante a solicitação do professor Wenger sobre um exemplo de Autocracia, a turma respondeu num tom de inevitabilidade: o Nazismo. O tempo da inscrição histórica é facilmente esquecido quando a vulgaridade é a tónica do ensino. A soberba do presente e a respectiva projecção do futuro fazem esquecer o efeito pernicioso do poder quando não existe uma educação para o «mundo da vida» (entendido como raízes). Daí que o hiato entre a ordem e o caos seja muito ténue.

A transição da esfera privada (família) para a esfera pública (escola) é apresentada como possível condicionante das decisões tomadas pelos alunos. Para tal é dada especial atenção à esfera privada das principais personagens. Os universos são muito semelhantes. Todos apresentam linearidade entre os dois domínios, excepto Stolte cuja dinâmica privado-público é profundamente distinta. Desde o início, Stolte toma as posições mais radicais e bélicas – cujas razões mais à frente abordaremos -,, surpreendendo o professor o que demonstra o poder de atracção que A Onda exerce sobre os alunos que mais sujeitos estão à necessidade de reconhecimento.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Poder IV

A partir da descrição feita do chefe dos Nambiquaras na obra de Levi Strauss, parece claro a existência de uma liderança legitimada pela sua acção: na resolução dos problemas, na antecipação de situações, dinamismo na escolha de itinerários, em suma, o chefe é o que expõe, criando uma identidade grupal. Max Weber define bem este poder: «Probabilidade de impor a vontade a outrem.» (Max Weber, Três Tipos de Poder Legítimo, trad. Artur Mourão, www.lusosofia.net. Pág.3).

O Poder Legal caracteriza-se por uma autoridade possuidora de dois elementos fundamentais: heteronomia e heterocefalia. É resultado de uma vontade exterior ao indivíduo e, por isso, é formal. A regra é o seu leit motiv e o seu ideal é ordenar de acordo com objectivos pré-definidos. O objecto é burocrático, encontrando-se materializado, segundo Weber, nos modernos estados e nas empresas capitalistas (Max weber, op. cit. Pág. 4).

O Poder Tradicional existe para além da legalidade, legitimando-se na tradição dando corpo à máxima «valendo desde sempre» (Max Weber, op.cit , pág. 5). A dominação patriarcal é o seu máximo expoente e possui raízes numa subordinação inevitável face ao poder tradicional. Cria-se, por isso, uma rede de dependências, exercendo o governo por meio da aversão, da emoção, do agrado e, acima de tudo, dos favores pessoais. Weber apresenta dois tipos de poder tradicional: o poder segundo ordens e o poder puramente patriarcal (Weber, op cit, pág. 5 e ss). O primeiro está vinculado à estrutura patriarcal (clã, chefe de família…), é o tipo mais puro do poder tradicional; o segundo representa mais um nível de administração mas cuja servidão lhe está intimamente ligada. A posse é traduzível por este tipo de poder em que os meios de administração são inteiramente desenvolvidos e legitimados pelo senhor, diferenciando-se, por isso, do poder legal pela sua forma intrínseca de deliberação de normas.

Finalmente, o poder carismático vai corresponder com uma ruptura do poder tradicional. Reconhece-se no líder a capacidade para desviar as relações habituais. Caracteriza-se por uma dedicação especial, pelos seus discursos, revelações mágicas, pela postura heróica, a uma pessoa. Os seus tipos mais puros são a autoridade do profeta, o herói guerreiro e o demagogo. Este último é uma invenção dos estados ocidentais contemporâneos; os outros dois correspondem a mecanismos mais ancestrais, embora actualizantes, próprios de uma tradição judaico-cristã. O herói corresponde ao Herzog, ao guerreiro carismático com o seu séquito (Weber, op cit, pág. 10 e ss).

sexta-feira, 17 de julho de 2009

PoderIII

Levi strauss: A escrita e o poder.

Em Tristes Trópicos, Levi Strauss, através da sua epopeia junto dos Nambiquaras apresenta a situação da escrita face à cultura. Numa perspectiva empírica somos levados a considerar a escrita algo como concernente à expansividade intelectual em detrimento do carácter sociológico. Ora, Strauss demonstra a predominância deste face ao intelectualismo. O chefe, aquando da apresentação do lápis e do papel, facilmente depreendeu a utilidade da escrita embora não tenha exercido qualquer intenção significativa. Embora «o seu símbolo fosse utilizado, a realidade continuava estranha» (Levi Strauss, Tristes Trópicos, capítulo XXVII). Facilmente se constatou que a utilização de «traços» por parte do chefe serviu, acima de tudo, para a efectivação do poder. Strauss descreve a cena de tal forma que nos transmite uma imagem do que seria a representação do chefe face à escrita e a consequente admiração de que era alvo pelos seus súbditos. Esta descrição levou Strauss a demonstrar, através de exemplos históricos, a função primordial da escrita: manutenção do poder. Poder-se-ia objectar esta ideia a partir da constatação da importância da escrita no desenvolvimento científico dos séculos XIX e XX. Contudo, Strauss diz que a escrita é condição necessária mas não suficiente (Levi Strauss, op.cit), na medida em que o período com maior desenvolvimento humano – neolítico – não coincidiu com a descoberta da escrita. Desta forma, a escrita sugere um rosto de manifestação imperial e manutenção de territórios. Inclusive, a luta contra o analfabetismo possuiu uma intenção que visava, acima de tudo, o reforço e o controlo do poder. Porquê? Por que «ninguém pode ignorar a lei» (Levi Strauss, op.cit).

terça-feira, 7 de julho de 2009

Poder II

Uma particularidade muito presente nos textos bíblicos é a adequação do bem face ao poder. Na leitura da Epístola aos Romanos, S. Paulo evidencia a necessidade de um bom cristão de se submeter ao poder. O próprio Santo Agostinho nas Confissões identifica o pecado original com o pecado da desobediência. Obviamente que S.Paulo, além de ter em mente fundamentar uma convivência pacífica com Roma, sabia que Jesus Cristo era o alfa e o ómega, o princípio e o fim (ver Álvaro Pais, Espelho dos Reis); o poder temporal, humano, está ao serviço das vicissitudes pecaminosas do homem, o que não significa que Deus não esteja lá presente, pelo menos mediatamente, por que imediatamente estão os seus representantes, o que, no caso de S. Paulo, se concretizava. Portanto, «submeta-se cada qual às autoridades constituídas. Pois não há autoridade que não tenha sido constituída por Deus e as que existem foram estabelecidas por Ele.» (São Paulo, «Epístola aos Romanos», in Bíblia Sagrada, Verbo Lisboa, 1982, pág. 1291). O horizonte desta postura pode ser encontrado num conceito muito caro à tradição cristã em geral e católica em particular: a Unidade como contraponto à diversidade, esta sim, pode protagonizar a pulverização e o pecado, a divisão e a desordem, o primado da matéria sobre o espírito.

Poder I

Será possível definir poder? Wittegenstein traz-nos uma transmutação significativa quanto aos conceitos, entendidos como noções. Quando definimos algum conceito é difícil encontrar pontos de intercepção, apesar de dizermos o conceito. Por outras palavras, dizemos que o criket ou o futebol, a natação ou o xadrez são desportos apesar de se encontrar entre eles aspectos diferenciadores: o carácter competitivo, as noções de perder e ganhar apresentam nuances particulares. Wittegenstein concluiu, então, que o que existe é «uma rede complicada de parecenças que se cruzam e sobrepõem umas às outras. Parecenças de conjunto e de pormenor» (Wittengenstein, Investigações Filosóficas, F.C.G., Lisboa 1997). A forma encontrada para nomear esta ideia foi o termo «família», na medida em que os membros de uma família apresentam particularidades individuais e porque percorre nesse conjunto uma transversalidade de aspectos que determinam o significado, o nome. Consequentemente, quando falamos em Poder não devemos descurar a intercepção de uma multiplicidade de aspectos que se cruzam e promovem uma certa identidade.

domingo, 5 de julho de 2009

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Política

1- Falência do modelo democrático tradicional.

- Agregação de preferências e negociação de interesses individuais.

- A base deste acordo está no símile do mercado em que reduz o debate a uma panóplia que faz confluir na avaliação entre as partes a congruência de interesses privados.

2- Características da democracia deliberativa

-Pressupostos: A) a justificação das propostas apresentadas; B) estas razões devem ser acessíveis a todos os cidadãos interessados (que possa ser entendível pelos cidadãos); C) é um processo dinâmico (o sua justificação não é eterna); D) visa tomar uma decisão que seja vinculativa num certo período de tempo.

-Objectivos:

A) Visa a melhoria da qualidade das decisões colectivas.

B) Almeja o escopo de uma cidadania participativa.

C) Projecta-se na busca colectiva da melhor proposta para todos.

3- Virtualidades do modelo deliberativo:

- Reforça as orientações das deliberações para o interesse geral em detrimento dos interesses privados.

- Possibilita o desenvolvimento cognitivo e práxico.

domingo, 28 de junho de 2009

Política

Habermas e as três dimensões da política
- Pragmática: Refere-se à necessidade de encontrar os meios mais adequados para alcançar determinados fins (eficácia).
- Ética: refere-se à ideia de bem e correspondente vida boa (adequação das medidas com o bem comum).
- Moral: refere-se à equidade na regulação das relações entre as pessoas e na tomada de decisões (inquirição acerca da imparcialidade das diferentes propostas políticas).

domingo, 14 de junho de 2009

Política

Quando Deus disse que no princípio era o verbo deve ter-se esquecido do livre arbítrio humano, para quem no princípio era a verborreia. As eleições europeias trouxeram à superfície a negação da política como «o meio pelo qual os cidadãos se tornam simultaneamente conscientes da sua dependência mútua e do estabelecimento de relações recíprocas, não se orientando apenas para a competência mas para o diálogo e o entendimento» (Acílio Estanqueiro Rocha). O que se viu e ouviu foi uma política que não orientou os cidadãos para a competência nem para o diálogo. Searle diz que dizer é fazer, a linguagem é acção. Deste modo, aquilo que se disse não prognostica grande coisa no fazer. Seria importante tornar a ler Habermas e refundar a política na deliberação e na autenticidade.

domingo, 24 de maio de 2009

Ler Filosofia

Em boa hora a colega Luísa Nogueira se lembrou da oportunidade de leccionarmos uma obra filosófica no 10º ano. Com algum cepticismo à mistura, escolhemos a obra Apologia de Sócrates. Curiosamente a resposta que temos tido por parte dos alunos é bastante positiva. Mais um exemplo da relação causa-efeito entre a seriedade e a filosofia. Enquanto andarmos a brincar à filosofia, menos ensinamos filosofia. Quanto mais sujeitarmos os alunos ao recurso primeiro da filosofia, mais reconhecimento esta terá da parte daqueles. O resto é conversa.

domingo, 17 de maio de 2009

Estava em frente à televisão quando vi uma reportagem sobre uma corrida onde participavam, além do nosso Primeiro, alunos das Novas Oportunidades. É curioso, mas de repente intuí a ideia, muito cara a Eduardo Lourenço, quem em Portugal se vive numa permanente representação. Ora, se lançarmos pontes para José Gil, essa permanente representação vincula-se ao seu conceito de inscrição, ou falta dela. Somos um povo que nunca levamos a sério os nossos filósofos e sempre encaramos a literatura como momentos idílicos do nosso Portugal. Por isso também não os levamos a sério. A ideia transposta para um cenário romântico do não sei quê saudoso, embaraça qualquer síntese superior. Por este motivo temos poucos ou nenhuns filósofos. Como é possível leccionar a Filosofia? Proponho uma mudança de planos. A ideia surgiu quando li a aula ministrada por um colega de uma escola no Algarve aos alunos e respectivos pais. Por que não fazermos isto: começar nos pais e acabar nos alunos?

segunda-feira, 4 de maio de 2009

A propósito da comemoração do dia da Europa, a becre vai organizar uma pequena exposição de alunos no âmbito da disciplina de Geografia. É óbvio e natural que as questões subjacentes a esta disciplina (população, instituições, países...) estarão presentes. Como é que a disciplina de filosofia poderá participar? Inicialmente recordei-me de um excelente ensaio de um Professor da Universidade do Minho, Acílio Estanqueiro Rocha, publicado num número da Revista Portuguesa de Filosofia do ano 2002, sobre a História da Ideia de Europa. Por ser um importante e rigoroso ensaio de pendor académico, a tarefa de o tornar acessível  aos nossos estudantes revestia-se de alguma dificuldade. Como simplificar o complexo? Essa talvez seja a nossa tarefa, mas neste caso não parecia ser possível. Até que me surgiu a ideia de um livrinho de Steiner (como gosto de Steiner) cujo título é A Ideia de Europa. Nele se desenvolvem os principais axiomas que, segundo o autor, contribuíram para a ideia de Europa. Talvez a Europa seja isso mesmo, uma ideia. Os cafés, o pedestrianismo, a escatologia, Jerusalém e Atenas, as ruas, são marcas indeléveis de uma Europa que se presta a um contínuo suicídio. Mas também são marcas que se vinculam a uma civilidade sem par e que a faz legítima herdeira das grandes civilizações. Aí está uma forma de simplificar a Europa: expressão de uma ideia que tem as raízes em cinco princípios básicos e cujos atributos se encontram na diversidade.

sábado, 2 de maio de 2009

O Corpo. Um caso.

Hamid Karzai é o actual Presidente do Afeganistão. É ele que dá o rosto por tudo o que vai acontecendo nesse país. A ele me dirijo para, assim que seja possível, estudar um pouco de fenomenologia do corpo. Daí retiram-se sérios e aprazíveis argumentos que contrariam  legislações, ou projectos de, que ferem a inteligência de um ocidental que, apesar de todos os defeitos que se lhe pode apontar, possui uma característica própria do ocidente: a crítica (obrigado Popper!) falsificacionista. Vem isto a propósito de uma lei (ou projecto de) oriunda dos responsáveis afegãos que determinam, entre outras raridades, a presença de legitimidade na violação infligida pelo homem à mulher, quando, e atentem a esta particularidade, estão em situação de matrimónio.
A violação, sendo transversal a todas as dimensões humanas, é, contudo, mais visível quando é aplicada ao corpo. Creio ser esta a dimensão visada pela legislação afegã. 
O corpo, essa carne onde tudo se torna possível, é uma matéria com uma substancial dimensão espiritual. Ele é a presença de linguagem e de simbolismos que, ao contrário do que a nossa matriz nos pretendeu dizer, fornece o verdadeiro significado à vida. Matar o corpo é morrer (afinal o corpo corresponde à nossa imortalidade). Matar o corpo de outrem é um acto de suicídio. Por isso, peço às mulheres afegãs que acelerem o suicídio daqueles falos petrificados. Como? Saiam do Afeganistão. Venham até Portugal, até à Europa ou até à Oceania; percorram o mundo com aqueles imortais olhos verdes. Deixem os tipos sozinhos até à capitulação.

domingo, 26 de abril de 2009

Aproveitando a realização do IV encontro Ciência Para Todos no próximo dia 30 de Abril, o Departamento de Filosofia irá promover uma sessão cinematográfica com a exibição de filmes (Contacto, A Ilha, Dr. House) que se vinculem a uma determinada ideia de ciência e suscite problematizações epistemológicas. Também haverá uma exposição elaborada pelos alunos do 11º ano sobre temáticas epistemológicas, com especial destaque para a evolução da ideia de ciência e para a apresentação de filósofos contemporâneos que se debruçaram sobre as questões que a actividade científica promove. Embora estas iniciativas estejam vocacionadas para os alunos do 11º ano, toda a comunidade educativa está convidada.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A angústia

Recomeço das aulas significa relançar a esperançar, encher o corpo de motivação dar asas ao desejo. É esta permanente fuga da realidade que faz de nós, humanos, uns seres imprevisíveis. O problema está na dessincronização entre o Real e o real. Quanto mais esquecemos o Real, mais dificilmente o encaramos. Este esquecimento é directamente proporcional ao real criado que depende de nós. Ensinar (que me desculpe o eduquez) encontra aqui toda a sua angústia existencial. Um professor tem actualmente que tentar encontrar uma situação de equilíbrio: entre a necessária e indispensável mecanização do discurso e dos recursos conceptuais nele presentes, o processo de promoção de sinapses (ao que se torna necessário um conhecimento próprio do modo como o nosso cérebro funciona) e a tão abragente motivação. Vem isto a propósito da temática do 10º ano de escolaridade que o nosso departamento guardou para este terceiro período: a dimensão política com o inevitável recurso a John Locke e Thomas Hobbes, dois contratualistas clássicos, preparando o terreno para a exigente tarefa de ensinar Rawls. Numa ida proveitosa a uma grande superfície (o ar estava respirável) deparei-me com um livro elaborado a propósito da série Perdidos e onde se produziam análises filosóficas, nomeadamente no que se refere a dilemas éticos e à problemática contratualista do Estado Natural e Positivo. Este tem sido o meu trabalho. O problema é o ponto de equilíbrio entre o Real e o real.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Carnaval - ponto de vista filosófico-humorístico-decadente

Prometi a mim mesmo que escreveria um pequeno conteúdo sobre o Carnaval deste anos, à semelhança do que fiz no ano transacto.
Tudo na vida deve ser encetado num momento próprio. Como estou há três anos na Escola Secundária Madeira Torres, o primeiro ano foi de visualização, apuramento dos sentidos, primeiras impressões, no sentido humeano do termo. Impressões simples ou simples impressões, não sei, o que sei é que enveredei por uma postura de distanciamento e, simultaneamente, coloquei o véu de ignorância. desloquei-me pela escola, sujeitei-me à audição de comentários comuns, visualizei, com um exigível distanciamento, as meias de licra das (dos?) matrafonas - convenhamos que, para um gajo do norte, não é pêra doce - escutei com atenção os rituais, as palavras, os ritmos que as coisas iam tomando.
No segundo ano já estive num patamar diferente. Fotógrafo (mau), tomei contacto com os suores dos foliões e ganhei coragem para colocar uma peruca. Nunca havia usado uma peruca... Quando a coloquei ocorreu-me de imediato a ideia de que havia perdido a minha masculinidade... Era loira. Comprei a uma senhora que tinha montado a banca na escola. Quando a vi, o nervosismo apoderou-se de mim. Aproximei-me e disse: «que...quer...quero....co...comprar a peruca. A senhora, experiente nestas andanças, esboçou um sorriso de benevolência. Não levei a mal. De facto parecia um jovem que está próximo de conhecer o bom da vida, ontologicamente falando.
Este ano... fica para o próximo post.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Num departamento escolar deve imperar a partilha, a formação, a crítica e o ponto de vista do profissional (já alguém dizia que um ponto de vista é sempre uma vista através de um ponto). No que respeita à disciplina de Filosofia, mais essa vertente se torna exigível. A Filosofia é um dos palcos onde se verificam mais acesos debates sobre conteúdos programáticos. Era ainda estudante quando assisti a um debate (imagine-se)televisivo - creio que nos finais dos anos oitenta - sobre os novos programas de Filosofia. Lá se encontravam, entre outros, Manuel Maria Carrilho e, creio, Alexandre Fradique Morujão. Foi um debate aceso com duas tendências «beligerantes»: a tendência anglo-saxónica e continental. Não escondo que Carrilho teve um discurso eloquente e persuasivo. Também não oculto que sentimentalmente a vertente continental clamava por mim. Este debate nunca chegou a ser resolvido. Ainda hoje há «úlceras estomacais» por resolver. Contudo, há uma vertente, parece-me que liderada pelos colegas da Arte de Pensar - desculpem se estou a ocultar alguém - que tem tido uma postura razoável, no sentido científico da palavra, isto é, mantêm uma clara orientação, são coerentes naquilo que produzem, há um fio condutor na estrutura do que propõem. O problema é que, do outro lado da barricada, mora uma clara desorientação, uma indefinição. Os próprios manuais, na ânsia de agradar à «esquerda» e à «direita», englobam tudo numa «salada de fruta» onde não se consegue discernir o tronco, o caminho. Vem isto a propósito da definição do conhecimento como «crença verdadeira justificada» e do percurso sugerido pela «crítica na rede». O desenlace desta temática entronca na noção de coerentismo. Tomei a liberdade, no que ao meu departamento diz respeito, de leccionar esta temática. A dimensão holística presente, concordando com a tendência de enquadrar no todo as partes e o próprio todo ter uma dimensão maior do que essas partes, é estética e, se calhar verosímil. Curiosamente, os alunos gostaram. Precisamente por que é estético, o coerentismo suscita um conjunto de recursos e de exemplos atractivos: desde palavras cruzadas (para haver a consciência da interdependência), passando por quadros conceptuais de situações quotidianas. Porém, sentia que faltava algo. Sentia que a exigência proveniente da presença da Filosofia do Ensino Secundário pedia mais. Uma intuição cartesiana sugeriu-me os «jogos de linguagem» das Investigações Filosóficas de Wittegenstein. Será possível fazer esta ponte? É legítimo fazer este percurso sem que me seja lançado um anátema pela consciência do rigor filosófico? Lancei o seguinte exemplo retirado de algures (peço desculpa aos autores):
Um professor de cardiologia defende que a aspirina ajuda a prevenir enfartes.
Um seu aluno mais atento pergunta: «porquê?»
O professor responde: «porque diminui a formação de ateromas nas paredes vasculares».
E o aluno torna a perguntar: «porquê?»
O professor responde: «porque como anti-inflamatório ela diminui as inflamações das paredes vasculares.»
Assim, tanto o professor como aluno ficaram satisfeitos com a resposta. Esta «condição de satisfação» é apoiada pelo coenrentismo - as várias proposições são justificadas pela consistência de outras crenças, construindo-se uma rede - e pela noção de jogos de linguagem - pela presença de signos linguísticos comuns a uma determinada família de falantes. Um aluno, surpreendentemente mais atento a estas lides, perguntou-me - «qual o interesse então da filosofia». Engoli em seco, ao mesmo tempo que respondia: - estar atento à linguagem, procurando o rigor, desmontando discursos, solucionando problemas... O aluno retorquiu, dizendo: «solucionando problemas?». respondi dizendo que os problemas do ser humano são...linguísticos.

PS: o diálogo, infelizmente, é pura ficção.

terça-feira, 17 de março de 2009

O Mestre

Steiner ensinou-me uma coisa: não há ensino sem mestre. Não há aprendizagem sem o corpo. Não há ensino-aprendizagem sem dialéctica do domínio. Hodienarmente a figura do mestre desvanece-se. Ele é substituído pelo estrelato de figuras em si mesmas inexistentes. Paradoxalmente, este vazio clama pela referência, pela mão que nos guia, pelo poder da razão e pela razão do poder. Continuo a afirmar, apesar da pouca experiência de vida e de ensino, que a palavra, o olhar, o gesto, a atitude são os melhores recursos didácticos. Podem surgir TIC'S, Power Point, efeitos especiais numa sala de aula que em nada substitui um olhar. O problema actualmente está, creio eu, no pseudo-nivelamento. O mestre e o discípulo encontram-se face a face numa aparente planície. O problema está aí: quando nos deparamos com um horizonte vasto ficamos sem rumo, perdemo-nos na sobranceria da leviandade. É importante que haja montanha para alguém, bem lá no cimo, nos indicar o melhor percurso. É tudo uma questão de reconhecimento do poder do conhecimento. Eu tive o meu mestre, não o ultrapassei, como seria de esperar, porque...o perdi!

quarta-feira, 11 de março de 2009

Em relação ao último post, nomeadamente à última interrogação, há várias saídas: mais académicas e mais estéticas. Prefiro as segundas às primeiras. Porquê?
Quando os alunos me abordam, nas suas ingénuas interrogações dos dezasseis ( o que nem por isso é negativo, estão mais leves...), sobre a pertinência do estudo de Descartes em particular ou de outro filósofo em geral, respondo que também estudam Newton embora, num contexto puramente pragmático, tenha uma relevância residual. E estudam por que a noção de progresso não se compadece com a ausência de história. Procurar os motivos, as razões, as causas, os antecedentes são condições para melhor entender o presente. A vida sem memória não existe; o futuro sem passado é vazio e sem sentido; ou, talvez melhor, o passado ganha sentido com o futuro. Aqui se inscreve a linguagem. O recurso linguístico de um saber exige uma permanente busca da fonte. Muito mais na filosofia! Heidegger dizia que a linguagem é a casa do ser, é o desvelamento da verdade e fora desta linguagem, parafraseando Wittegenstein, nada existe. Assim, o enriquecimento da linguagem é condição da compreensão do mundo; a compreensão do berço da palavra e a causa do entendimento da realidade.
Contudo... na filosofia há mais do que um tempo, há uma intemporalidade. No jogo conceptual há um ritmo esquemático, há uma beleza intrínseca ao texto argumentativo que o ultrapassa. Talvez seja por isso que os alunos, surpreendentemente, gostam de estudar Kant. Não por aquilo que diz, mas por aquilo que não diz. E mais não digo!

terça-feira, 3 de março de 2009

Estava a leccionar Descartes. É sempre gratificante conviver com um filósofo. Penetramos nos seus pensamentos, as sinapses cognitivas desenrolam-se de uma forma aprazível, sentimo-nos rejuvenescidos, quase que atingimos uma espécie de clímax que nos faz transportar para latitudes intelectuais onde... só estamos nós e Descartes. Num ápice, dei-me conta de uma realidade imanente que, não só está aí, como nos acorda para a evidência. Uns visualizavam as recentes mensagens oriundas do éter, outros bocejavam mostrando em primeiro plano as suas armações da moda, sem esquecer aqueles, mais generosos, que transmitiam formas de pesar evidentes pelo espectáculo a que assistiam. Como sair desta?

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Charles Darwin

A nossa escola, associando-se às comemorações dos 200 anos do nascimento de Darwin, promoveu uma exposição na BECRE sobre o ambiente intelectual do século dezanove, centrando-se na ideia geral de EVOLUÇÃO. Não nos fixamos somente nas ideias inovadoras de Darwin relativamente a este tema, mas procuramos enquandrá-las no ambiente filosófico do séc XIX: Hegel, Marx, Malthus, Spencer e Heackel, enriqueceram a Teoria da Evolução das Espécies. O trabalho ficaria incompleto se não avaliássemos, de um modo transversal, as implicações em todo o desenvolvimento intelectual posterior: Nietzsche, Freud e, o que talvez se torna mais importante, a nova visão do mundo que o evolucionismo darwinista nos trouxe quando decretou a sentença de morte aos três grandes mitos: antropolátrico, antropomórfico e antropocêntrico.


A destruição de dogmas


1- O dogma antropocêntrico, onde o Homem

ocupa um lugar central de todo o universo;


2- O dogma antropomórfico, remete-nos para a

divinização do Homem, como sendo criado à

imagem de Deus;


3- O dogma antropolátrico, que consiste na crença da imortalidade da alma.

Também o homem, com os seus estados mentais, é oriundo dessa base comum, com a diferença de se ter adaptado mais rapidamente às dificuldades do meio, desenvolvendo o sistema nervoso central, acrescentando a si a produção imaterial e intelectual. Infere-se daqui a redutibilidade do homem em relação ao cosmos, por possuir uma evolução fundamentada num ponto de vista fisiológico oriunda da génese comum com a totalidade. «O nosso corpo humano - diz Haeckel - formou-se lenta e gradualmente através de uma longa série de vertebrados ancestrais; e o mesmo aconteceu com a nossa alma que, sendo uma função do nosso cérebro, se desenvolveu gradativamente em correlação com este órgão.»


Na Filosofia encontramos em forma de embrião a ideia de evolução:


Georg Wilhelm Friedrich Hegel (Estugarda, 27 de Agosto de 1770Berlim, 14 de Novembro de 1831)

Filósofo de imprescindível leitura que marcou de forma indelével a nossa civilização, Hegel tornou-se uma referência para quem se debruça sobre a problemática da evolução.
A frase que mais o identifica é: o que é real é racional, o que é racional é real
A realidade funciona da mesma forma que a lógica, modo de ser próprio da espírito.
Qual o modo como a lógica funciona: através da dialéctica? Tese, antítese e síntese.
Qual o modo como funciona a realidade? Tese, antítese e síntese.

Hegel com um sentido arguto, descobre que a história, a natureza, o pensamento possui um movimento contínuo de evolução até um FIM. Para se alcançar este fim, o processo desenrola-se num sentido de permanente confronte entre tese e antítese e finalmente um período de síntese. Para Hegel, toda a realidade se processa deste modo.
Exemplificando:
Na arte: Tese: Arte egípcia; Antítese: arte grega; síntese: arte romântica.

A Arte Romântica seria a arte por excelência, a última arte, a arte que melhor reencarnaria o espírito do mundo (weltgeist).


Karl Heinrich Marx (Tréveris, 5 de Maio de 1818Londres, 14 de Março de 1883)

Um dos filósofos que mais influenciou a história do século XX. Bem ou mal, as suas palavras ainda hoje são discutidas acaloradamente, sinal de que a sua obra foi de facto importante.
Independentemente de tudo o que pode ser dito, Marx foi um estatuto interpretador da história, descobrindo nela também uma evolução. A novidade que Marx apresenta é a influência da infra-estrutura (modos de produção, economia) na definição da superstrutura (ideias, política, valores…)
A história é um espelho desta dialéctica:


COMUNISMO
CAPITALISMO
FEUDALISMO


Sentido evolutivo da História
A passagem de uma ordem histórica para outra ordem histórica desenvolve-se a partir de uma revolução, resultante de uma luta de classes. A classe anteriormente dominante, não respondendo às necessidades do momento, é substituída por outra classe social. Também a história tem um fim, o advento do Comunismo.


A IDEIA DE EVOLUÇÃO NA FILOSOFIA E NA HISTÓRIA

Antero de Quental (Ponta Delgada, Ilha de São Miguel, Açores, 18 de Abril de 184211 de Setembro de 1891)

Na obra Tendências Gerais da Filosofia na Segunda Metade do Século XIX sintetiza de um modo inteligente o que de mais relevante aconteceu no pensamento durante o século XIX. Colocando nas suas preocupações intelectuais correntes como o Materialismo, Evolucionismo e Hegelianismo, Antero crê que a História da humanidade é uma forma de crescente autonomia até à liberdade moral da pessoa.


A ideia da evolução em TODA a realidade (O MONISMO)


Ernest Ernst Haeckel (1834-1919)
1. Momentos da Ontogénese traduzem as fases da Filogénese.
2. Através de metamorfoses sucessivas, os seres vivos mais complexos podem ser o resultado de outros mais simples.
3. As espécies vivas não são fixas e distintas (como se havia admitido com o fixismo de Lineu-Cuvier) mas variáveis e susceptíveis de transformação.

A irresistível paixão que arrasta Eduardo para a simpática Otília, Páris por Helena, e que triunfa de todos os obstáculos da razão e da moral é a mesma poderosa força de atracção inconsciente que, quando da fecundação dos ovos animais ou vegetais, impele o espermatozóide vivo a penetrar no óvulo; é ainda o mesmo movimento violento pelo qual dois átomos de hidrogénio e um átomo de oxigénio se unem para formar uma molécula de água»
Haeckel, Ernest; Os Enigmas do universo, trad. Jaime Filinto, 2ª edição, Lello & Irmão, Porto, 1926, p. 6.


Herbert Spencer (Derby, 27 de Abril de 1820Brighton, 8 de Dezembro de 1903)


Adopta o conceito de HEREDITARIEDADE

Encara o evolucionismo como critério supremo da Filosofia

E como instrumento unificador da Ciência.

Leis da evolução:
- Do menos coerente para o mais coerente;
- Passagem do homogéneo para o heterogéneo;
- Do indefinido indeterminado para o definido determinado.

Estas leis aplicam-se de igual forma ao biológico e ao social, com uma diferença:

- Na sociedade, em virtude da liberdade, existe uma maior dispersão das partes constituintes. Nos organismos vivos essa dispersão é menor.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Carnaval de 2008 um ponto de vista filosófico-humorístico
PARTE I – O CONTEXTO
Talvez seja interessante começar este texto com um aviso: nunca vivi o Carnaval de Torres, a não ser ouvindo de forma indiferenciada algumas notícias que, aqui e ali, pululavam no emaranhado de informação frívola dos mass media sobre esta época festiva. Por este motivo, comentar este evento poderá ser arriscado, pois tal vai depender, certamente, das reacções dos profissionais da folia.
Não imaginava que o Carnaval fosse tão intensamente vivido numa escola como é o caso da nossa. Contudo, o mais interessante não foi constatar essa intensidade, mas a própria seriedade com que todos nele participaram. Justifica-se esta seriedade?
Os momentos dionisíacos antecedem ou procedem de momentos de privação. Daí o surgimento do Carnaval (carne+vale). A carne, como bem exemplifica esta primeira imagem, é o momento de pecado que, levado ao limite, servirá para preparar o longo período de jejum (40 dias) que antecede a Páscoa. Por este motivo, todos estão com o Carnaval, até as pessoas mais insuspeitas (ou suspeitas?). O mais engraçado é que o poder, que George Orwell tenta ilustrar na obra 1984, não tem humor, como bem ilustra Sócrates na imagem . Esta sisudez, bem presente no pinoquínio nariz é um poder que priva o riso, oprime o humor e a inteligência. Sim, porque não há melhor forma de expressar inteligência do que saber rir, principalmente de nós mesmos.
A forma mais proeminente do exercício do poder é bem exemplificada na situação em que qualquer semelhança entre a realidade e a ficção é mera coincidência, isto é, qualquer semelhança entre o primeiro, o poder, e a ASAE é pura coincidência. Só ainda não entendi porque razão o robe fez parte da indumentária do folião da ASAE. Será com o intuito de convidar Sócrates para cenas mais íntimas, ou para ilustrar a intimidade do poder com os seus agentes? Bom, a resposta ficará para cada um. O Carnaval também serve para a orgia intelectual e imaginativa.
Há alguma relação entre o jejum e a paródia feita ao governo Sócrates e respectiva equipa educativa ministerial? Continua a haver coincidências intrigantes.
O que não se percebeu realmente foi as relações perigosas entre os poderes presentes naquele dia e naquela escola. Uns, objectos da paródia, os outros, em defesa dos oprimidos. O poder escolar foi de Zorro, acrescente-se que não era aquele Zorro do Banderas, eram muitas Zorras. O Zorro só por si era perigoso para os foliões, muitas Zorras é quase o fim do mundo.

PARTE II- OS ACONTECIMENTOS

O Madeiródromo estava a compor-se. Havia profissionalismo. Era fácil constatar a forma quase natural como as pessoas se cruzavam, se riam. Era como isto já fizesse parte da sua vida, era como o seu código genético possuísse a combinação Carnavalesca. Para quem de fora observasse, isto é, para quem se sentisse extraterrestre, usar uma peruca revestia-se de um acto de afirmação pessoal, quase transcendental, tamanha era a introversão. Se não os consegues vencer, junta-te a eles! Aprendi então lugares comuns destas situações, nomeadamente a linguagem: «estás toda boa!», «estás toda boa!», «estás toda boa». É verdade, foi a expressão mais comum. É verdade, sempre no feminino. Aprendi que, de facto, o Carnaval da Madeira Torres é um carnaval de afirmação do feminino, exceptuando as Zorras e as bandidas. O surgimento das designadas matrafonas era recorrente. Alguns ainda tentaram imprimir alguma testoterona, mas ficaram pela banda desenhada. Assistiu-se, inclusive, à tentativa de alguma masculinização, objectivo não conseguido, pois eram jeitosas (os). Mas qual foi a real intenção destas Metralhas? Antecipar o acontecimento no Carolina? Quiseram dizer que vamos todos presos? Há alguma relação entre o poder de Zorro e a desenvoltura mediática das Metralhas? É outro enigma que cabeças pensadoras facilmente encontrarão resposta. Eu, pessoalmente, não!
Além de tudo isto, houve uma representação que me impressionou.: a gravidez. Foi uma gravidez com alguma gravidade! O que se passa com estes homens???? Ainda por cima, impuseram à sua representação (?) o respectivo parto, sem dor, com as águas a provocarem uma pequena inundação.
A cada instante da exibição no Madeiródromo sentia-me cada vez mais familiarizado com a situação. Aos poucos ia aprendendo que eu é que estava mascarado, na medida em que não tinha qualquer máscara. Eu é que era ridículo, porque não ridicularizava. Eu é que fazia figura de parvo, porque não aparvalhava…
Os acontecimentos sucediam-se em catadupa, mas sempre com uma desorganização organizada. Esta foi, aliás, uma das principais características deste Carnaval. O aparente caos ocultava uma ordem estabelecida. Parecia que todos sabiam os seus papéis, quer nas formas espontâneas como se exibiam, quer nas coreografias ensaiadas.
Fora da coreografia estavam uns senhores com gravata. Inicialmente pensei que essa mesma gravata fazia parte da paródia. Ainda recorri a alguns préstimos. Contudo, perante tal absurdo, os meus interlocutores olhavam-me com desdém ou com o sentimento de pena. Resolvi então investigar. Depois de algumas diligências junto de alguns alunos descobri que…não sabiam. Esta inocência hormonal, onde os pseudo-problemas não existem, revelaram-me uma coisa óbvia: não se fazem certas perguntas! Imaginem só a expressão de um aluno quando se lhe pergunta sobre a existência de alguém com gravata! É neste tipo de situações que o professor perde discernimento e respeito por parte dos alunos. Mas também era Carnaval…

PARTE III – EPÍLOGO

Para mim este Carnaval foi uma autêntica sala de aula. Além de muitas outras coisas aprendi uma aspecto essencial: o Carnaval da Madeira Torres é um momento único. É único pela ambiência que cria à sua volta e único porque nega o humor sistemático e calculado, onde as pessoas são obrigadas à participação. Não, o Carnaval da Madeira Torres é um local de espontaneidade e, simultaneamente, de respeito pela diferença, contra o humor estereotipado, fabricado, onde todos são obrigados a participarem. Não será exagero dizer que, enquanto o humor está em decadência face à sua industrialização, na Madeira Torres o riso é mais autêntico: está no interior de cada um.
Será o último reduto da liberdade face ao Big Brother power?
Estou agora aqui a pensar como hei-de acabar este texto. Gostaria de ser diferente e não utilizar aqueles lugares comuns que fazem parte dos grandes discursos. O que de mais imaginativo me ocorre é propor para Titular os seguintes elementos: Dinis Martinho, Elsa Caldeira, Paula Paulo, Fátima Prates, Elsa Tomás. Em virtude da imaginação e do bom gosto evidenciado, os seguintes elementos não preencheram os requisitos mínimos do cinzentismo exigido para este título nobiliárquico: Luís Filipe Marques da Silva e Rosário Cadete. Para o ano há mais!